Sentir é Ver
Há coisas que não se veem com os olhos. Não porque sejam invisíveis — mas porque estão fora do alcance do costume. E o costume é míope.
Há uma fresta. Sempre há. Entre o gesto e a intenção, entre a fala e o que ela evita dizer. E quem aprende a respirar nesse intervalo começa a entender o que não tem nome.
Não é dom. É ferida aberta que decidiu não se esconder. É o silêncio que aprende a falar. É tocar o mundo sem luvas — e aceitar que ele pode cortar.
Alguns andam como se a vida fosse só superfície. Contam os dias, mas não os sentem. Falam, mas não se escutam. Não é culpa — é medo. Porque olhar de verdade é perigoso. Pode-se ver demais.
Mas há os que não suportam a secura. Que param — não por cansaço, mas por necessidade de ver o que ficou atrás. Um olhar de lado, um tremor de boca, a folha que cai e não faz barulho, mas faz sentido.
É preciso uma espécie de coragem para viver assim — despido. Coragem de ser afetado. Coragem de não endurecer.
E então, de repente, tudo começa a ter cor. Não cor de tinta. Cor de verdade. Até a dor vem com perfume. Até o vazio faz companhia.
Porque há quem veja com o corpo inteiro. E sentir — ah, sentir — é a forma mais radical de estar vivo.
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